Eu consumo logo existo. Houve períodos de hino à utilidade, produtos com funções definidas, usados por décadas. Disponíveis agora em qualquer grande superfície, o nicho que faltava está preenchido, o que não existia já está criado. Não desmereço a capacidade de reinventar um produto, questino o desperdício.
A necessidade que não existe não é sinónimo de inútil, apenas dista do fundamental. E quando levamos para casa algo que é fixe, é barato, mas não é fundamental, será irremediavelmente parte da decoração do sótão, em poucos anos, ou esquecido no fundo da gaveta, ou jogado ao lixo, sem remorsos, após um incidente quase acidental. Desperdício.
Ecologia? Não necessáriamente. Cabe ao senso comum estabelecer um padrão, uma cultura, um processo. Ser ecológico já é um processo actual, uma moda ou mais um mercado. O desperdício tem uma razão mais efémera, complexa e persistente, coexistindo com este dever: é um acto ecológico jogar no local adequado os restos do produto já sem valor.
Somos os netos da Revolução Industrial, filhos do Mercado de Consumo, da massificação do produto. Enquanto admirámos as cores do arco-íris nas prateleiras comerciais, preenchemos falhas de emoção. Olho para meu lixo em quatro partes (orgánico, vidro, papel e plástico) e penso nas quatro partes da sardinha que meu avô via serem divididas por sua mãe.