terça-feira, 29 de abril de 2008

Uma vida e a vida enquanto uma criança

Na caixa perdida da arrecadação, onde guardei a inocência que julgava poder usar um dia, encontrei uma pequena semente. Resolvi dar a semente para a menina, aproveitando para ensiná-la porque a terra, a água, o sol e o ar eram tão importantes para o crescimento daquela possibilidade que cabia na pequena mão que então a segurava. A menina sorriu ao olhar para mim, e nos lábios viam-se a inocência perspicaz que havia outrora guadado na caixa. Naquele momento percebi que a vida estava ali transmitida, não a vida que se opõe à morte, meramente física, mas a vida que não se ensina, que não se ganha, que não se perde, a vida que apenas se vive, como pode, de acordo com quatro elementos que nos sustentam. Queria sorrir assim, mas apenas saiu-me um sorriso de concordância. De qualquer forma, ela parecia satisfeita, como também o ficaria se lhe tivesse dado a própria caixa, ou laço que a atava, ou o pequeno grão de areia que estava no fundo. A vida enquanto uma criança não precisa de motivos, calendários, tempo ou espaço para simplesmente viver. É do que julgava guardado e esquecido que recuperei apenas a semente que transmito. Mas será uma possibilidade tão infinita um apenas? Não. Aquilo que deixa de viver lança a semente prévia e renasce, mesmo que no coração de uma vida enquanto criança, mesmo que na vida de um coração que se quer sempre criança.

 

Este post também nasceu noutro blog e renasce aqui, como resposta à dor que uma morte enquanto criança pode causar a um coração que se quer sempre criança.

1 comentário:

Tuki disse...

Felizmente, para a salvação da esperança no humano, o infanticídio e - como neste triste caso - o filicío, são exceções. E é por isso que nos chocam, porque o normal é os responsáveis zelarem com muito cuidado e amor pela vida de suas crianças.